domingo, 2 de junho de 2013

03 - UM ENCONTRO COM A SAUDADE


Eu e Natasha compartilhávamos tudo. Nos completávamos. Ela era sonhadora, vivia nas nuvens, enquanto eu tentava puxá-la de volta ao chão. Sei lá, era um equilíbrio perfeito.

Ela queria casar, ter filhos... uma família.
Eu sempre pedindo calma. Não tinha estabilidade alguma em emprego nenhum. Na verdade, eu não queria era me sujeitar a abrir mão de meu estilo. Eu sempre fui um cara muito teimoso, quer dizer, eu era um cara muito teimoso.
Quando terminei a faculdade de jornalismo, tudo que eu tinha era inúmeras colunas maravilhosas gravadas no .doc de meu computador, que acabaram caducando pela validade da informação que elas analisavam.

As coisas começaram a ficar difíceis.
Ela queria casar, ter filhos... uma família.
Eu pedia a calma que ela não estava preparada para ter.
Ela me pedia o conforto e a atenção que eu não estava conseguindo lhe dar.
Então, eu me dei um ultimato: iria trabalhar no primeiro jornal que me chamasse para uma entrevista.

Foi aí que me apareceu o jornal.
Eu percebi, de cara, que aquele lugar não era para mim. Era um jornal bom, de grande circulação, que além do diário, organizava uma revista para a região com cultura, esporte e dicas gastronômicas.
Não sei porque separavam gastronomia de cultura, mas eu era responsável pela parte cultural.
Em menos de duas semanas, tentei dar à coluna um pouco da minha cara. Transformei as resenhas enrijeçadas na estrutura nome do evento, data, horário, local e breve comentário, em um artigo de opinião de um único evento. Escolhia algo interessante na cidade e só falava daquilo.
Resultado: deixei de participar da revista e só fiquei com as notícias de porta de cadeia, do diário.

Meu salário diminiu, eu não queria ficar atrás de ocorrências de delegacia a vida inteira.
Foi aí que a paciência dela acabou...

- Você ainda gosta dela?
- Muito...

- E como ela está?
- Casada... com dois filhos. Como ela sempre sonhou.
- humm...

- Eu acho que esperei demais pelas coisas, as arquitetei demais... fiz tudo como achei que seria o certo. Não bebia quando namorava...
- Mas ela caiu fora depois que você reduziu o salário no jornal?

- Não pense nela como uma interesseira... ela sempre via o quanto eu me esforçava para conseguir as coisas, mas o quanto isso durava para se realizar. Eu acho que meu fracasso acabou decepcionando ela. Sei lá...
- Olha, as vezes não era para acontecer, né?
- Talvez...

- Foi a primeira namorada?
- A única com quem me envolvi bastante. Sete anos... desde os dezesseis.
- Nossa...

Nos conhecemos no colégio. Ela fazia parte do grêmio estudantil. Eu escrevia alguns versos bobos. Uma vez que escrevi um poema sobre o diretor. Não criticando, nem fazendo caricaturas jocosas, só relatando, com sensibilidade, um posicionamento que não concordava. Isso chamou atenção dela. Ela me chamou para entrar no grêmio.

Corrigia os textos do pessoal. Eles escreviam muito mal, sabe? Mas tinham idéias ótimas. Eles me achavam um gênio... mas eu só consegui evoluir até ali.

- Quando tinha dezoito anos escrevia do mesmo jeito que escrevo hoje.
- Sei...

- Não sei... mas acho que era mais feliz naquele tempo...

- Bem, eu espero que tudo dê certo com você...
- É... você tem que ir né?

- Sim... mas volte sempre que quiser conversar... gostei de você.
- Mesmo?

- Pra ser sincera, mais ou menos... na verdade fiquei com um pouco de pena. Mas volte mesmo assim. É sempre bom conversar.

- Ah ta... valeu, Saudade.
- Não se ofenda...













Nenhum comentário: