terça-feira, 15 de abril de 2008

A NECESSIDADE SOCIAL DA ARTE

Fazendo uma breve análise do que foi dito a respeito da arte como necessidade social, muito bem explorada por Neobrazillix, decidi revisar a manifestação e com isso enriqueceê-la um pouco mais, se é que isso é possível.

A priori, diz-se que a única saída é o comportamento criador, a criação, o novo, e aí é traçado em comparação uma falta de criação de nossa sociedade. Eu diria que isso não se limita apenas à arte, mas tem valores que transcendem até mesmo o político e o econômico e atinge as relações sociais do dia-a-dia. As pessoas cada vez mais se apóiam nos ombros alheios para caminharem, e não há certa importância na construção de conhecimento, na utilização do antigo como ponte e inspiração para novas realizações.

Pois é, defendo que isso não se dá exclusivamente na arte, pois temos raízes indestrutíveis de uma nação que se fundou em cima da corrupção e da ganância pelo enriquecimento. Isso fez da nossa educação apenas um manche que possibilite nos guiar para um destino de grandes ouros e tesouros. O mundo todo não está em sintonia com nossas conquistas, mas está para ser explorado, consumido, torrado. E eis que tomamos as mesmas atitudes dos primeiros europeus que popularizaram as terras brasílicas. Faz-se necessário uma reflexão para o grupo. Chega de individualismos!

Escuto Arnaldo Jabor falando que o Brasil sempre foi um país cinematográfico, que possui temas e infindáveis palcos para as telonas, e ainda critica o Oscar, valoriza o Grande Otelo. Pois não tiro méritos de Grande Otelo, não desminto as críticas ao Oscar, mas ponho na mesa uma questão que pode fazer de minhas mãos pernas e de minhas pernas mãos: se incomoda tanto nosso crítico, as situações cinematográficas atuais, junto de todo o palco político e social do país, e se há espaço para se gravar e produzir ótimos trabalhos atualmente, por que o silêncio? Eu resumo silêncio voltando à questão do comportamento criador. Há o momento em que cansa apreciar Glauber Rocha e Chico Buarque, e que de tanto observar a genialidade de ambos, temos a vontade de fazermos nossa história, de também nos posicionarmos e defendermos nossos direitos, nossas vontades e exaltações.

É fato que produções culturais não mudam nada rapidamente. Não trata-se de um assistencialismo, não é um Fome Zero, ou uma justificativa de votos. Mas são as produções culturais, junto de reflexões sociais, de esqueletos movendo-se para se pensar no homem, que formam paradigmas, que quebram padrões.

Logo, é de se imaginar que o incentivo não virá de cima, a menos que os forcemos a nos incentivar. O comportamento criativo vem do indivíduo para assim atingir um grupo. Não temos nenhuma publicação formal, estamos no começo da estrada, e com certeza há aqueles que já caminharam milhas e nos fazem comer poeira, mas aproveitamos o espaço que temos, nos enfiamos nos buracos que nos abrem pouco a pouco, e quanto ao resultado que isso renderá, não importa. Tem-se aqui não a necessidade de publicações e aplausos que se apagarão com o tempo, mas a necessidade de refletir e atualizar, refletir e acrescentar, criticar, berrar, urrar! Ou somente falar, sabendo o que se diz e o que se escuta.

- Ricardo Celestino

Um comentário:

Neo Brazillix disse...

Bem, vou esquecer a introdução com “Olá, Ricardo...” pois nossa relação é muito mais que troca de posts e respostas. É algo alcoólico e real... então vamos logo ao que interessa.

Ontem fui a Cinemateca e assisti “Maré, A Nossa História de Amor”. Digo que o filme em si é uma droga, uma porra de um porre de vinho Chapinha. É um musical baseado em Romeo e Julieta, ocorre na periferia do Rio. Na favela da Maré. A nossa Julieta é filha de um traficante. O nosso Romeo irmão de outro. Um amor impossível, unido pela música e pela dança.

Eu já esperava que fosse um filme terrível sim, fui com a intenção de ver o debate no final da sessão. O debate foi técnico, sobre fotografia e câmera. Bom para entender de algo que sou completamente leigo.

Lá estava um rapaz “infiltrado” no público. Morador da favela Maré. Ele ficou decepcionado com o filme, esperava que mostrassem as partes positivas da favela, pelo menos a realidade de lá. “É um filme ficcional. É uma fantasia, a intenção não é mostrar isso”. Logo respondeu o diretor de fotografia.

Concordo, a intenção do filme é mostrar o amor entre os dois personagens principais. Não há a obrigação de mostrar nada, além disso. O cenário é a favela e a junção dos personagens é o centro de toda a história.

Aí que está. O filme utiliza-se, como tantos filmes atuais, a cosmeticação da pobreza e da fome. A garotada dançando feliz de um lado para o outro. Claro que eles tem direito à felicidade. Mas não vejo pontos de mudança nisso.

A função do artista é mostrar a merda e não apontar a mudança. Incentivar a mudança. Montar uma crítica, fazer a galera pensar. Sim, a arte cria modificações e influencia o povo. E, infelizmente, o que vemos é uma idiotização onde o responsável é a tele-novela e filmes como esse.

Não vejo mudança em glorificar personagens como Glauber e Chico. É necessário sentir inspiração por revolucinários, mas suas obras pouco dizem hoje em dia, na nossa realidade. Talvez seja necessário utilizar Glauber, ou somente suas estéticas. Mas lembre-se que para criar o novo é preciso destruir o velho. “Viva a Eucaristia do funesto para destruir o costume seleto”. Destruir, não. Quis dizer mastigá-lo, ingeri-lo e transformá-lo em influência. Porém, a partir do momento que essa paixão torna-se a principal inspiração, não há mudança.

O que se vê no cinema hoje é um ufanismo à favela e a crítica a “zona sul”. Culpando os usuários pelo armamento da favela, que hip hop é melhor que balé, carregar uma arma é legal etc. É apenas uma troca de papéis. Inclusão dos menos privilegiados ao meio burguês, um pensamento de massa hipócrita.

Onde estão os artistas? Será que estão muito ocupados com resenhas e propagandas do McDonald’s? “O preço do conformismo será a aniquilação da humanidade, e – às vésperas de um apocalipse – existe uma verdadeira escassez de idéias que apontem uma saída”.
Estou cansado de filmes que são novelas de duas horas. Estou cansado da Globo Filmes. Estou cansado. “É preciso vencer essa inércia, e essa paralisia, esse medo de termos idéias, posto que antes de modificar o mundo, uma idéia modifica quem a teve. Abandonar as certezas e aceitar o risco do mistério onde tudo é incerto”.

Volto agora para a Cinemateca. A decepção do morador da Maré. O cara que não pode passar pela “Faixa de Gaza” senão cortam sua cabeça como exemplo aos outros. Ele não deveria estar feliz de ver um filme assim gravado onde ele nasceu? Não. Claro que não. E não estava. Sabe que tudo aquilo não passa de baboseira. Merda burguesa, um olhar classemédiano da periferia. É legal só para quem não é de lá. Só para quem não precisa ficar deitado em baixo da cama para fugir de balas, não apanhar da polícia...

Fora isso. O filme é terrível em tudo. A história é fraca. As músicas são terríveis. Os diálogos preconceituosos e o final shakesperiano não me comoveram, tive que me esforçar para não iniciar uma frenética gargalhada.

O que quero dizer é, há falta de idéias. Há apenas criações comerciais. Não há diferença entre a prostituição e diretores de filmes assim. Há apenas uma. As prostitutas e os michês são sinceros.