terça-feira, 19 de maio de 2009

ACALENTADOS

Num bar da Mooca...

Observei que meu copo esvaziava. Reparei que meu olhar vacilava. Tentei ver mas só vi assombreado, o tempo ficava nevoado. Levantei e me joguei pro lado, com cuidado, não caí no chão. Pedi a conta e apertei a mão do garçon. Seu nome era Thiago.

Saí carregado do bar,
Não conseguia nem enxergar.
Pisei torto no chão,
E pus meu carro, na contramão.
Só vi a lanterna acender, e mais nada,
Acordei com a cabeça inchada.
Sacudi a poeira do corpo,
Estava morto? Que nada.
Só parei quando encontrei minha morada,
Na rua de cima, casa cor de barro.
Avenida bem movimentada, eu moro
Na Paes de Barros.

Uma das pessoas mais queridas que já vi na vida, Carolina, me abraçou e me beijou. Estava suado, com um pouco de frio e um pouco de calor. Naquela hora da noite, com aquela geada, o sangue quente por causa da marvada, despi minha roupa e fui logo pro banho. Me acalentou. Me acalmou. Quase dormi e Carolina me trocou.

Segurar tua mão não é sofrimento algum,
Eu me orgulho de ter um marido bebum.
Me apaixonei quando éramos estudantes,
Agora você saí e eu cuido de nossos brilhantes.

Calma que a vida é uma praça,
Todo mundo vê, todo mundo anda e comenta,
Eu sei que não se vive sem a graça,
D ser um boa-praça, pra seguir em tormenta.

Quando vem eu quero logo te trocar,
Não suporto este teu cheiro de bar.
Diga logo o que trouxe para mim,
Fico aqui esperando meu querubim,
Ai de mim.

Eu me troco e fico pronta para amar,
Mas você vem correndo a decansar,
Não me espera, mas eu me ponho a sorrir
Vendo você, meu bebum, dormir.

Minha mãozinha passeava nos cachinhos ralos. Ele que era dono de uma cabeleira grande, hoje na tua cabeça dá pra encontrar até calos, calos de vivência, experiência, pensador. Uma das coisas mais bonitas que me disse um dia foi, Carolina venha só ver o que pesquei pra você, e no pesqueiro tinham deixado cair uma bota suja molhada. Ai que engraçadinho, ai, que nada. Ai, que menino, ai que marido... ai que acalentada!

De noite meu pescoço vazio,
Chama pro macio, meu amor.
Eu só queria que passasse essa dor,
Essa quentura que vem e que desacalenta,
Eu queria escrever um jornal, um livro, um recado,
Passo mal.
Não me sinto bem,
Não é enjôo de neném.
Estou magoada,
Não estou menstruada,
Estou angustiada,
Não estou desempregada.

Me chamaram pra uma festinha,
Você disse que já vinha, que já ia chegar.
Deixei pra lá, vou te esperar,
Dá-se um jeito pra gente ficar.

Você me avisou que o ônibus atrasou,
O bar inundou,
Que teu pé entortou,
Que o médico faltou,
Que teu patrão te ligou,
Teu pai te chamou.

Deixa assim, deixa bem,
Fica pra outro dia, outro dia você vem.

E quando chegou,
Me acalentou.

- Ricardo Celestino

Um comentário:

Ádlei Duarte de Carvalho disse...

Olá Ricardo,

gosto muito do que leio em sua página. Muito bom!!

Cara, não estarei em Sampa dia 30 não. Só no dia 06 mesmo. Mas estou sempre por aí.

Meus livros estão em livrarias de Minas Gerais, mas podem ser adquiridos também pela página da Editora. Basta entrar lá no blog e clicar sobre a imagem da capa para ver.

Abraço.