domingo, 26 de maio de 2013

02 - UM ENCONTRO COM A SAUDADE

Sou jornalista e escrevo numa coluna sobre cultura. Minha rotina é ir aos lugares e escrever alguma coisa sobre eles. Meus dedos criativos são livres para compor uma resenha que caiba em um quadrado de vinte centímetros de um jornal diário.

A coluna sai às quartas. No dia do jogo. No dia em que as pessoas estão chateadas com a rotina do trabalho. No dia em que a semana estaciona. No dia em que ninguém acha legal ler sobre cultura. Exceto a galera lá do meu jornal.

Eu costumo ir para vários lugares diferentes. De todos os lugares que eu conheço tenho milhares de coisas para escrever, compor, contar. Cada local, cada arte, tem a sua particularidade muito bem descrita.

Mas parece que as pessoas cansaram um pouco da inovação. Elas não gostam de criar e preferem apenas exaltar o conhecido. Eu queria poder escrever minha coluna a moda daqueles homens que inventaram o jornal.

Isso me irrita...

- E é aí que eu entro...
- Como?

- Você sente saudade de toda aquela agitação de antigamente né?! Pessoas criando coisas novas... gritando!
- É... parecia que antes tudo era feito com mais amor.
- Pois é... aquela época de gente com pulso firme, né?! Que tinha gogó!
- Exatamente. É como se você soubesse exatamente o que estou pensando...
- Aquela época que você não viveu...
- Isso... Qual seu nome?
- Saudade...
- Ah...

- Por que você está triste? Quer dizer... o fato das pessoas não escreverem coisas novas, ou de um jeito mais bacana, não deve influenciar tanto assim na tua vida pra te deixar tão chateado.

- Não sei... só que, bem... acho que já fui mais feliz um dia.
- Acha mesmo?
- É...

Quando eu estagiava no jornal, mesmo ganhando menos, tinha uma coisa que me fazia acreditar que eu ia pra frente.
Meus escritos sempre foram ruins, mas eu era novo... parecia que com o tempo melhoraria.
Só que ele não foi tão legal comigo... o cargo que eu assumi foi por falta de gente que o quisesse.
Acredite, em São Paulo, não é todo formado em jornalismo que aceita trabalhar num jornal de bairro com um salário de dois salários mínimos para escrever besteiras culturais.

- Eu acho que, no fim, deixei tudo nas costas da esperança.

- E por deixar tudo nas costas dela, você acabou aqui... sentado nesse banco comigo.

- Acho que se eu tivesse optado em ser outra coisa, estaria bem pior do que estou hoje.

- Será? Sua vida não foi traçada pelas opções que você fez? Será que se você tivesse colocado alguma vírgula fora do lugar, em um desses momentos aí, você não seria hoje alguma outra coisa?

Eu adorava escrever textos literários e dar de presente para as pessoas. Um amigo estava afim de uma garota, eu escrevia um poema. Uma garota queria impressionar algum affair, eu escrevia um conto.

Um nerd queria impressionar um nerd, eu escrevia um conto de terror, uma história fantástica, um elfo que matasse orcs, qualquer coisa.

- Este banco está desconfortável?
- Não. Eu gosto da sua companhia.

- Então vamos lá. Deve haver alguma coisa na sua memória que te conforte.

- Acho que sim. O amor... o amor foi diferente...

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