domingo, 26 de maio de 2013

Gabriela despertou-me Jorge, ou Jorge despertou-me Gabriela?


Eu lembro do dia em que disse:

- Sabe, Jorge Amado é um escritor que não me atrai. Vender uma imagem da Bahia que não condiz com a realidade, produzir romance para virar novela da Globo, tudo isso me chateia muito. Eu gosto de romances sociais.

Puro preconceito de quem nunca havia lido nada do autor. Só o conhecia do boca a boca, das aulas teóricas do cursinho. Em sua essência mesmo, na humildade de sentar e ler, não conhecia. Mas... a língua não tem osso, e nós falamos com aquela potência de críticos literários, versificando saberes de ouvi por aí.

E nós somos assim. Nas nossas escolhas literárias, muitas vezes somos tomados pelo conceito de leitura dos outros e deixamos de conhecer boas obras só porque elas não são o IN do momento. Se você tem esse tipo de postura para escolher livros, nos abracemos! Fomos formados maus leitores. Somos daqueles que andam com um livro qualquer embaixo do braço e nos vemos no direito de opinar a leitura alheia. Tudo tem que ser lido, assistido, ouvido, para não cometermos esse erro de criticarmos sem saber.

Jorge Amado é maravilhoso. Descobri na leitura de Gabriela, cravo e canela um mundo imenso. É um autor para ser bem lido, bem cultuado. Devemos explorá-lo em detalhes, refletir as intrigas por ele postas, observar o caos de sua obra em um processo que faz acontecer na levidez do acontecendo. Gabriela existe para que reflitamos aquele mal estar de um progresso que acontece em todo lugar, menos na mentalidade humana de seus personagens.

Ricardo Celestino

02 - UM ENCONTRO COM A SAUDADE

Sou jornalista e escrevo numa coluna sobre cultura. Minha rotina é ir aos lugares e escrever alguma coisa sobre eles. Meus dedos criativos são livres para compor uma resenha que caiba em um quadrado de vinte centímetros de um jornal diário.

A coluna sai às quartas. No dia do jogo. No dia em que as pessoas estão chateadas com a rotina do trabalho. No dia em que a semana estaciona. No dia em que ninguém acha legal ler sobre cultura. Exceto a galera lá do meu jornal.

Eu costumo ir para vários lugares diferentes. De todos os lugares que eu conheço tenho milhares de coisas para escrever, compor, contar. Cada local, cada arte, tem a sua particularidade muito bem descrita.

Mas parece que as pessoas cansaram um pouco da inovação. Elas não gostam de criar e preferem apenas exaltar o conhecido. Eu queria poder escrever minha coluna a moda daqueles homens que inventaram o jornal.

Isso me irrita...

- E é aí que eu entro...
- Como?

- Você sente saudade de toda aquela agitação de antigamente né?! Pessoas criando coisas novas... gritando!
- É... parecia que antes tudo era feito com mais amor.
- Pois é... aquela época de gente com pulso firme, né?! Que tinha gogó!
- Exatamente. É como se você soubesse exatamente o que estou pensando...
- Aquela época que você não viveu...
- Isso... Qual seu nome?
- Saudade...
- Ah...

- Por que você está triste? Quer dizer... o fato das pessoas não escreverem coisas novas, ou de um jeito mais bacana, não deve influenciar tanto assim na tua vida pra te deixar tão chateado.

- Não sei... só que, bem... acho que já fui mais feliz um dia.
- Acha mesmo?
- É...

Quando eu estagiava no jornal, mesmo ganhando menos, tinha uma coisa que me fazia acreditar que eu ia pra frente.
Meus escritos sempre foram ruins, mas eu era novo... parecia que com o tempo melhoraria.
Só que ele não foi tão legal comigo... o cargo que eu assumi foi por falta de gente que o quisesse.
Acredite, em São Paulo, não é todo formado em jornalismo que aceita trabalhar num jornal de bairro com um salário de dois salários mínimos para escrever besteiras culturais.

- Eu acho que, no fim, deixei tudo nas costas da esperança.

- E por deixar tudo nas costas dela, você acabou aqui... sentado nesse banco comigo.

- Acho que se eu tivesse optado em ser outra coisa, estaria bem pior do que estou hoje.

- Será? Sua vida não foi traçada pelas opções que você fez? Será que se você tivesse colocado alguma vírgula fora do lugar, em um desses momentos aí, você não seria hoje alguma outra coisa?

Eu adorava escrever textos literários e dar de presente para as pessoas. Um amigo estava afim de uma garota, eu escrevia um poema. Uma garota queria impressionar algum affair, eu escrevia um conto.

Um nerd queria impressionar um nerd, eu escrevia um conto de terror, uma história fantástica, um elfo que matasse orcs, qualquer coisa.

- Este banco está desconfortável?
- Não. Eu gosto da sua companhia.

- Então vamos lá. Deve haver alguma coisa na sua memória que te conforte.

- Acho que sim. O amor... o amor foi diferente...

domingo, 19 de maio de 2013

UM ENCONTRO COM A SAUDADE


Não sei por que, mas pela manhã é muito difícil abrir meus olhos.

Mesmo com as percianas abertas e o verão estapeando minhas maçãs, meus olhos nunca querem abrir.

Um bom tempo depois do meu corpo, eles despertam ao som de um toque ensurdecedor de celular, me colocando em pé em posição de ataque: quem tenho que matar? Quem foi atingido? Para me colocar em pé, somente o som de tiros e explosões.

- Meu nome é Roberto e minha vida é uma merda!

Isso eu reflito no banho, enquanto a água quente faz com que minhas lágrimas nem sequer apareçam, e eu fico com a feição de um idiota chorando sem elas.

- Moro numa avenida paulistana cercada de gente que fede a merda. A minha vida...
- O que?
- Eles fedem à minha vida.

- Com ela?
- Também.

Então visto a pior roupa do armário. Só tenho piores roupas em meu armário. Não são roupas velhas, são roupas sem graça. Se eu tivesse que vestir uma roupa que me deixasse confortável em meu dia-a-dia, vestiria a fantasia daquele homem que aparece na TV.

Não há o que comemorar. Meus olhos ardem devido ao choro matinal forçado.

Cigarros esperam ao lado de um pão e uma xícara de café.

O viaduto era de chás.

Os chás faziam notas verdes,

Que faziam uma música,

Que mobilhava minha casa e tirava meus sentidos.

A vodca estava muito cara.

Natasha, Orlov te odeia!

- Orlov?
- Bem... é uma marca de vodca barata.
- Humm... Natasha?

- Bem... tem aquela barata que te dá nó na garganta, e aquela outra que me faz o mesmo. As duas me perseguem o dia seguinte inteiro: uma me causando náuseas e vômitos, a outra depressão.
- Poxa... literatura não é seu forte.

Pois é... caminho até uma padaria em frente ao meu apartamento.

Quase todos os dias alguém quase me faz o favor de me deixar feliz, mas breca quando deveria ter acelerado mais.

Na padaria, quem me atende é uma pessoa-registradora que parece uma máquina de fazer café e pão-com-manteiga.

Mas eu entro só para ler o jornal. Não ganho o suficiente para tomar café todo dia na rua. Eu sou uma máquina de angústias.

- Agora está melhorando...
- Meu dia?

- Não... sua literatura. Sabe, eu só te perguntei o que você faz da vida, não precisa narrar todos os teus passos.

- Poxa, é que faz tempo que ninguém me pergunta nada...

segunda-feira, 8 de junho de 2009

CÂNTICO AZUL

Senti vontade de levantar rápido depois de ter engolido aquela praga! - foi o que disse Carlos após consumir uma bolinha e agarrar-se ao violão. Sempre que exibia seus dotes solísticos um pouco fora de tempo, mas não sem brilho, estava com alguma química agindo em seu organismo. Sóbrio seria um dos melhores violonistas brasileiros, sóbrio conseguiria shows nos grandes teatros municipais ao lado de grandes orquestras o acompanhando, sóbrio seria aclamado como o melhor compositor e letrista sem escorregar alguns versos mal colocados e impulsivos. Talvez sóbrio Carlos seria estudante de administração e nunca teria pego num violão. Talvez sóbrio ele jamais teria sua Jazz band paulistana e não jamais gritaria em Mi maior.

Aquele ensaio era para a noitada no Cântico Azul, onde outros mais cinco Carlos se apresentariam com seus organismos reagindo com a variante de uísque, cerveja, vinho e talvez algo mais. O Cântico era um pedaço de New Orleans com um cadinho de Canecão, em São Paulo. A antropofagia que faltava nas ruas paulistanas.

- Ricardo Celestino

sexta-feira, 5 de junho de 2009

JOBIM, JOBIM!

Com wave, tirem suas conclusões...

impossível fazer igual!

http://www.youtube.com/watch?v=OVtys0snI3E&feature=related


http://www.youtube.com/watch?v=3d8y4HxW8Eg


http://www.youtube.com/watch?v=dwLJhBzs-jo&feature=related

CASAMENTO COM O OFÍCIO

Amarelado por cigarro
Eu espero a minha ida,
Cheirando a café,
Quem sabe chega minha subida

Quando será eu não sei,
mas eu espero minha vez.
Vão me chamar, você vai ver
Mas eu espero minha vez.

Tradição na minha cabeça,
Honrar o ofício e minha família
Amarelado por cigarros
E entupido de cocaína

Quando será eu não sei,
mas eu espero minha vez.
Vão me chamar, você vai ver
Mas eu espero minha vez.

Dos problemas os menos graves
Já ta tudo resolvido
Minha renda só aumenta
e meus sonhos são banidos

Quando será eu não sei,
mas eu espero minha vez.
vão me chamar, você vai ver
mas eu espero minha vez.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

SINAL FECHADO NA CIDADE DE SÃO PAULO

Cada vez mais eu vejo a distância,
Pessoas caminham em primeira pessoa,
olhando os próprios pés.

Eu olho meus pés.

Eu estou fechado na cidade de São Paulo
e isso já é o suficiente para que eu diga que
o sinal está fechado na cidade de São Paulo.

As pessoas são ilhas
e cada ilha na cidade é uma conversa,
é uma idéia, é uma gaveta,
de ilhas totalmente isoladas.

Cultura, política e sociedade,
Grupos cada vez mais individuais.

Quando vejo alegria,
E a semelhança de uma comunidade,
Inverdade!

Cervejadas ilhadas de risadas.
Almas penadas e coitadas
desfrutando um calor humano
pra não morrer de fome e frio no mar negro da cidade.

- Ricardo Celestino