quinta-feira, 14 de maio de 2009

NOITES TROPICAIS - NELSON MOTA


Tim Maia era amigo de Erasmo desde criança na Rua do Matoso, na Tijuca, quando ainda se chamava Tião e entregava marmitas da pensão de seus pais, dona Maria e seu Altivo, considerado no bairro um mestre dos temperos. Antes da música, o pequeno Tião aprendeu a comer bem e sempre foi gorducho. Quando saia para entregar as marmitas, pendurava-as num cabo de vassoura que levava nos ombros, como um pescador chinês de carnaval. Todos os dias na hora do almoço ele saía para fazer as entregas e, balançando suas latas, passava pelo Largo da Segunda-feira, onde sempre rolava animada pelada. Era irrestível. Em campo, Tião era o mais pesado e, às vezes, o mais violento: ia na bola como quem vai num prato de comida. O exercício lhe abria o apetite e Tião abria as marmitas e tomava uns goles de sopa aqui, beliscava um pastel ali, umas bocadas de arroz e feijão acolá, um pedaço de doce, e com as marmitas mais leves seguia para a entrega.
Tanto quanto de comida, Tião gostava de música. Começou a aprender violão sozinho, ensinou três acordes para Erasmo e os dois tentavam tardes inteiras, em vão, fazer no violão as complexas harmonias do ``Desafinado`` de João Gilberto, que adoravam. Quando depois Tião foi para os Estados Unidos, se correspondia com Erasmo assinando Tim Jobim e recebia abraços de Erasmo Gilberto.
Tião tinha 16 anos qaundo resolveu que iria para os Estados Unidos. Começou a dizer para todo mundo que ia morar com uma família americana num programa de intercâmbio, fez uma campanha de arrecadação de fundos na família e conseguiu, depois de suplicantes visitas, convencer o bondoso paroco da igreja da Tijuca a completar o que faltava para a passagem de avião, só de ida. Tião tinha falado tanto para tanta gente e dado tantos detalhes da sua ´´família americana´´ que acabou ele mesmo acreditando em sua ficção e se decepcionando: na chegada a Nova York ninguém o esperava no aeroporto. Em Manhattan e depois na vizinha Tarryton, Tião virou Tim e trabalhou de garçom, entregador de pizzas, aprendeu inglês, conheceu a música negra americana, cantou em grupos vocais, fez pequenos furtos e experimentou fartamente tudo que era droga leve e pesada. Uma noite, com três crioulos amigos, foi preso em Daytona Beach, onde estavam fumando maconha dentro de um carro roubado. Passou uma temporada na cadeia em Daytona e foi deportado para o Brasil.
Ba Tijuca, de tanto cantar o rock Bop-a-lena, Tim ganhou o apelido de Babulina. Mas Babulina também era o apelido de um garotão do Rio Comprido, um mulato atlético chamado Jorge, que também cantava Bop-a-lena, tocava violão e fazia parte da guange Os Cometas. Nas rodas da Praça Bandeira, ponto de encontro das turmas da Matoso e do Rio Comprido, já se comentava que Tim iria ter problemas com Jorge, que se considerava o dono do apelido por cantar a música há mais tempo. Mas tudo se resolveu pacificamente e Jorge acabou participando de uma serenata com Tim e Erasmo, no Beco do Mota, deibaixo da janela da generosa Lilica, que costumava receber a turma toda em sua cama, um por um. Chegavam a se formar alegres e ansiosas filas de dez, doze garotos à sua porta, e muitos jovens tijucanos e rio-compridenses tiveram com ela a sua iniciação sexual. Mas naquela noite acabaram todos na delegacia por reclamação dos vizinhos e o violão foi apreendido: a serenata não era de valsas e canções mas de twist e rock and roll.
Com suas festas de rua, na Casa da Beira e na Vila da Feira, os clubes portugueses da área, com suas quermesses e suas festas juninas, a vida na Zona Norte era animada e Jorge estava em todas com seu violão, cantando Bop-a-lena e sempre agradando as meninas, até que começou a fazer suas próprias músicas, passou a usar o nome de Jorge Ben e começou a tentar a vida nos bares de Copacabana.

- trecho de Noites Tropicais, de Nelson Mota.

Esse capítulo vai para um rapaz que voltou recentemente a terras brasileiras e sempre se esforça um pouquinho para ler as besteiras que escrevo aqui no blog! Valeu!

- Ricardo Celestino

quarta-feira, 13 de maio de 2009

VELHO DOCE DA VIDA

Alimentei-me à poesia,
Que alegria deste doce,
Que fosse tão bom se existisse,
Foi o que disse, um velho angustiado,
Iluminado em poucos dias e tão triste,
Que persistisse este açúcar eternamente,
Infelizmente a vida e esse fantasma que nos traga
Acaba.

Ainda que tive a chance de estar em pé,
Minha fé foram as sombras de minhas pernas,
Que pareciam eternas, conformando minhas conquistas,
Hoje artistas que passam minha infância vida a vida,
Numa só ida,
Numa só partida.

- Ricardo Celestino
LIBERDADE

Eu preciso escrever um texto de onze linhas sobre liberdade, e fico imaginando o quão cruel é limitar, questionar, oprimir e direcionar o desejo de outras pessoas. Se quiser beber que vá, se quiser fumar que vá, teus erros acabam sendo teus erros, infelizmente afetando a vida de pessoas próximas, mas teus erros são teus erros e no final das contas quem viverá bem ou mal com eles é você mesmo. Na verdade é o homem-ácido que corrói e varre nosso espaço como varreu civilizações e multidões com questionamentos de sim e não, certo e errado, bem e mal. Vassorinnhas mágicas que não deixam rastros, mas sabem como que é, um dia você tem que abri-las e limpá-las, senão a poeira toda cai no meio da sala e a sujeira de hoje vai ser amarrotada com toda aquela sujeira carregada de outras limpadas. Pena esta limpeza ser tão desnecessária às vezes.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

SOLIDÃO

Nossos instintos são tão fracos
Que nem meu reflexo eu percebo
Observo em meu retrato
Anos de desassossego.

Solidão, não me deixe
A companhia de minha sombra
É um cabide a apoiar meus vestidos.
Eu preciso de um corpo, sim.
E quem é que não precisa?
Mas solidão não me deixe,
Mesmo nas horas íntimas,
De acompanhar-me eternamente.

Vidros e vidraças são feitos para serem quebrados.
Estilhaça-me coração de papel,
Veja, a pele envidraçada,
O que tenho a oferecer
Nada!

Rompa-me e me corrompa,
Mas solidão não me abandone!
NADA...


- Ricardo Celestino


(um dos poemas do pseudo livro, ainda em .doc no meu computador, O Homem Engarrafado! rs)

Seguindo ainda a idéia de que as pessoas se engarrafam o tempo inteiro, permanecem enclausuradas e fechadas e parece que o mundo moderno é quem emancipa essa coisa toda. A rotina, as decepções, os altos comparados com os baixos, acabam empedrando nossos corações e aí, no fim de tua vida, ualá gênio engarrafado! Todo o conhecimento e tua história consumida e você preso naquela garrafa sem desfrutar de nada, nada, nada, nada, nada.

- Ricardo Celestino, despedindo-se de seu inferno astral em contagem regressiva.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

ENGARRAFAR-SE

A literatura do novo milênio é a literatura engarrafada.

Gênios, gênios, gênios por todo o lado,
Aguardando as mãos mortais lhe acalentarem para o despertar.
Gênios engarrafados,
Tão bons no que fazem,
e pobremente limitados.

Gênios engarrafados acabam escravizados,
a viver a vida engarrafados,
no aguardo...

calma lá que já vem,
calma lá que já já ele vem.

- Ricardo Celestino

quarta-feira, 6 de maio de 2009

VIRADA ACULTURAL

VIRADA CULTURAL

Faça-se já,
Enquanto cá
Já vai tudo indo, obrigado.

Fico feliz em reconhecer que temos um pai que nos escuta,
Obrigado por realizar-me, não deixar-me muda,
Falar, já!

Mesmo todas as outras ao mesmo tempo,
No sábado...

Sábado é dia de folia,
A escravidão começou de uma conversa jogada fora,
E foi, foi , foi.

Alegria, alegria, alegria,
Envenenada, alegria.

Vamos movimentar tudo!
Todos os esqueletos,
E volto a agradecer Deus,
Por fazer-me ouvir.

Um palanque pra quem gosta de percevejos,
Dia-a-dia é chato,
O bacana é uma vez ao ano.

Jesus Cristo obrigado,
Teus percevejos desfrutaram resultados,
Mesmo barrados,
Segundo a lei da eletricidade básica.

Maracatu com sorvete e batida eletrônica,
Rock n´ Roll com samba-rock e partido alto,
Funk com Rio de Janeiro em Estação da Luz,
Zumbis massacrando, festivais de curta com reggae a noite inteira,
Teatro Municipal, Tim Maia e Raul Seixas,
Antropofagia cultural induzida,
Tiro pra todos os lados,
Culto a cultura,
Cultura que não se faz todo dia,
Que não é dia-a-dia.

Com vocês,
Virada cultural,
Only this and nothing more!

- Ricardo Celestino

NOVA ALEGRIA....

ALEGRIA ALEGRIA

Você ouviu?
Você está me ouvindo mesmo?
Alegria não é uma coisa que se compra em supermercado,
Nem se faz bacharelado de alegria.

Alegria não vêm na química do teu ópio,
Nem na dose de teu veneno.

Alegria não está na fila do desempregado,
Nem na gravata do executivo,

Alegria não mora ali, pra que você possa bater, abrir, entrar e dizer,
Bom dia!

Não, não se come alegria,
Não se bebe alegria,
Não se faz sexo com a alegria,
Não se reza alegria.

Nem se caminha contra o vento para ter alegria,
Eu estou aqui caminhando a todo momento,
Você também.

Não é por que teu barraco é de papel,
Ou você mora num bordel,
Ou num condomínio fechado.
Ah! Tem gente pior e mais alegre!

Nem aqui, nem ali, nem na China,
Que você encontra bolachinha chamada Alegrol.

Você pode até traçar uma rotina,
Tentar um planejamento, um gráfico,
Fazer uma poesia, literaturar,
Mas nunca, nunca,
Irá desfrutar inteiramente de alegria
Nessa bosta de São Paulo.

- Ricardo Celestino