quarta-feira, 4 de março de 2009

CARNAVAL E QUARESMA II

Do carnaval à quaresma,
Dia-a-dia, todo dia,
Até uma, duas, três, quatro, cinco
Vezes ao dia...

Os tambores rufam,
As fantasias brilham.
O ensaio na garagem,
Ouvidos nos sótãos,
Garagens e sótãos e depois
Avenida.

Do violão, rua
Da vida, rua
Da lua, rua
Da rua, ensaio, orvalho, frio, inverno, e depois
Verão, carnaval, festa.

Todo dia, dia-a-dia...

Consuma etapas,
Lufadas de efeitos especiais,
Imagens, paisagens,
Carnaval de alegorias.

E depois

Quaresma de ressacas,
Um bêbado equilibrando-se,
Uma cabeça com enxaqueca,
Um sem-vida exaltado,
A andança que te gera calos
Mas que se recuperam para a próxima passeata.

Carnaval e quaresma,
Roda vai e vem.

(trecho da peça Lis)

PASSAGEM RÁPIDA

Num único dia,

o tédio dos punks,
a revolta dos guerrilheiros,
a alegria dos sambistas,
o bobismo dos emos,
a safadeza dos prostituandos,
a grandeza dos policiais,
a autoridade dos ditadores,
a infantilidade dos desenhos,
a loucura de um louco,
a bebedeira de um bêbado,
o êxtase de um drogado,
o calor de um diabético,
a lucidez de um psicopata,
a mocidade de um idoso,
a velhice de um adolescente,
a castidade de um cafetão,
a promiscuidade de um católico,
a orgia homossexual,
a oferenda espiritual,
a grande fulga pelo anal,
a melhoria de vida a cada dia,
uma melodia preferida,
uma música que deteste,
um cachorro que te morda,
um gato que te arranhe,
uma pomba que lhe marque,
sorte dela que eu não sei voar.

Um sábado e um domingo esperado,
quem sabe vem um feriado?
uma partidinha de sinuca,
um joguinho de futebol,
um caminhar na esteira,
uma grande pança cheia,
um saco gordo, irrugado,
uma barriga flácida e caída,
um inferno e uma vergonha,
uma garota e a margarida,
minissaia e entorpecentes,
o presídio e os presos,
a mulher e o marido,
o matrimônio e o pecado,
o feliz e o individado,
o ladrão e o roubado,
minha vida e tua filha,
sua vida e seu namorado,
e iremos sair juntos neste sábado.

Um patrão e um empregado,
aproveitam juntos a hora do almoço.
Um sol e algumas nuvens,
um dia nublado,
guarda-chuva e meia molhada,
jantar sozinho, acompanhado
de mim mesmo... de mim mesmo...

a solidão, aprendizado,
o medo de morrer só,
a solidão, um mar,
o medo de se afogar,
a solidão um esporte,
o medo da contusão,
a solidão uma economia,
o medo da crise financeira mundial e da perda de todos os meus pertences.
a solidão, me acompanha,

estou só...

a vergonha de artistar,
e a vontade de poetar.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

UM HOMEM QUE FOI À BIQUEIRA ou HOMENAGEM A GABRIEL MONTEIRO

Vou à bica, à bica
Desta água eu irei beber

Vou à bica, à bica
Consumir-me ao meu próprio prazer

Desculpe meu amigo, mas eu não vou te acompanhar
Minha bica fica longe, ela está em outro lugar
Se tu bebes desta água, sinto não poder beber
O consumo de nós dois é o que nos faz sofrer

Se o trabalho suado te faz repudiar
Vá a bica neste horário, estarei em outro lugar
Sofrendo e bebendo doutras águas não de fruta
Espero te encontrar no final desta luta

Vou à bica, à bica
Desta água eu irei beber

Vou à bica, à bica
Consumir-me ao meu próprio prazer

E teu corpo magro foi por causa destes mares
Quando eu te encontrei, quase não cruzei olhares
Não senti vergonha, tu és meu companheiro
É que não te reconheci como o Gabriel Monteiro

Seus olhos de opacos só enxergava vazis,
Dizem que não pensa mais nas lutas do país,
E se indiferente isto tudo é pra você
é por que na bica você encontrou o seu prazer.

Vou à bica, à bica
Desta água eu irei beber

Vou à bica, à bica
Consumir-me ao meu próprio prazer

Ah em teus lábios, o destino de tua ida,
Em toda essa jornada, não vê o que fez da vida?
Teu corpo formoso, lutava feito um lutador
Agora de tão fraco, os braços refletem tua dor

Seus olhos cor de mar, foram convites às gurias
Mas no dia em o que os reencontrei, eram apenas gotas tão frias
Seu aperto de mão, que outrora fora forte
Naquele nosso encontro marrecou em curto trote

Vou à bica, à bica
Desta água eu irei beber

Vou à bica, à bica
Consumir-me ao meu próprio prazer

Não é que esteja errado, não posso te cobrar isto
É que despensas esforço,ao viver a próprio risco
Sei que continuas um grande homem forte
E espero não saber do momento de sua morte

Se nos encontramos, foi por puro acaso
Sonho em te encontrar um dia fora deste vaso
E se deste prazer, tu morreres de felicidade
Saiba que mesmo assim, és um amigo de verdade

Vou à bica, à bica
Desta água eu irei beber

Vou à bica, à bica
Consumir-me ao meu próprio prazer

- Ricardo Celestino

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

CAMINHANDO A MAR ABERTO ou A EUROPA QUE NÃO RELUZIU EM MEUS OLHOS...



O trem me deixou na estação central da cidade e como minha mala estava muito pesada resolvi sentar um pouco e esperar os arrepios de meus músculos se acalmarem. Sentia os calos de meus pés doerem, sempre ardendo simetricamente, pelo tênis barato que calçava. Logo que o descanso de meu corpo começou, banhava-me de dentro para fora e a camisa começou a me incomodar. Não dava pra ficar tanto tempo parado...
Voltei com as sacas nas costas e caminhei pela escada que me levou pra cima. Senti-me mergulhado num mar, faltando um pouco de oxigênio em minhas narinas que cheiravam um ar de massas e necessidades. Havia carnes e gritos naquela multidão embravecida. No papel que me deram dizia Rua Direita, 95, e como de costume procurei a igreja, já que o local, me situaram, Praça da Sé.
Haviam olhos grandes por todos os lados, e eu caminhava sobre olhos e desviava de olhos o tempo inteiro. Parecia que meu cheiro era de gente nova, e não os condeno por me olharem. Se numa cidade pequena um novo chega, a impressão é a mesma. Aqui vale o número... perguntei a um dos olhos onde eu poderia encontrar o senhor Emanuel Texeira Vigo e ela me respondeu com os olhos. Continuei andando mesmo para não deixar que meu estar se incomodasse mais. Estava um pouco perdido, a mar aberto.
Eu precisava coçar minhas costas, precisava deixar as malas no chão um pouco, mas meus sentidos me traíam. Naquele lugar eu conseguia cheirar pela boca, ouvir pelos olhos e enxergar pelo nariz. Degustar nem me veio a mente naquela hora de desencanto. De onde eu vinha, esta cidade era impecável, a Europa americana.
Avistei uma gigantesca catedral. Eles gostam de coisas grandes, percebe-se. E se fosse para depender dos olhos, que dependesse dos olhos de Deus. Resolvi que ali eu ficaria um pouquinho, faria uma reza para descansar e talvez uma benta para me refrescar. Eu havia feito viagem, ônibus, trem e metrô, e a hospitalidade ainda não servira meus calcanhares.
A igreja era como as de lá, só que com monumentos e arquiteturas muito mais detalhadas e maiores. A imaginação estava tudo lá. Pra que missa? Com um prédio daquele, a missa já ta feita como exposição e lugar era o que não faltava para eu poder me descansar. Deixei de lado a mala, por que na casa de Deus ninguém ofende ninguém, e sentei bem pertinho do senhor cruxificado. Fiquei ali quietinho, rezando baixinho, enquanto sentia um gostosinho me passar pelo corpo todo. O relaxamento veio com a fé, eu acreditava, e fui ver onde colocavam a benta.
Esse raio de sacola, clamaram, fica pro meio do chão e não nos deixam passar, e eu educadamente fui lá buscar a mala que ficou pelo caminho. O padre não gostou não e ainda profetizou-me uma desgraça, me entitulou um conceito e me encostou com grossura. Pelo menos deu para descansar.
Rua direita, lado direito, foi mais fácil com a ajuda do emissor de Deus. E eu achando que estava a alto mar, quando na verdade só presenciei a prainha. Caminhei por vontade, mas se não fosse não faria diferença. Corpanzis juntos de corpanzis, fui só prestando atenção na numeração. Número 95.
Meu cunhado ganhou uma bolada com um tal de Emanuel Teixeira Vigo, e ele montou para mim um comércio de arte cinematográfica com cópias feitas em sua própria casa. Os fornecedores eram bons e de outras regiões. Estava lá, com seu bigode impecável, regendo o mar. Ele me apresentaria o mundo europeu, meu irmão... meu irmão me apresentaria a verdadeira cidade de São Paulo.




HISTÓRIA DA PRÉ-HISTÓRIA

Hoje a arte é pré-histórica,
Brinca com bolinhas coloridas
Tem depressões preto e cinza,
Não gargalhada a vida
Com a natureza de um Noel.

Hoje a arte ta pra lá,
Despreparada pro que vai e vem,
Tem pressa de se cumprir
E tem orçamento para fechar,
Uma correria de rotina escriturária.

Hoje a arte atingiu uma montanha,
E tem uma carinha moderna e fofa.
Pintam ela da cor que bem entendem,
E fica linda se olhada e suspirada
Como um pacote de presente caro.

Nada mais declaro à arte,
Por que ela se sustenta a si só
Virou bacharelado e licenciatura
E tão dizendo que tem mensalidade cobrando alto
Pelo pressão de um bom Machado.


(trecho de LIS)

LIS – Eu não chorei pela morte do meu pai... eu chorei pela falta de companhia que meu pai me trouxe. O vazio que eu nunca tinha sentido. Eu chorei pela saudade, e não pelo ato de morte. Aliás, ninguém chora pelo ato de morte, todo mundo é egoísta, não acham? Pensam no sofrimento que terá ao saber que nunca mais verá a pessoa, e aí falam, ai coitadinho, ele morreu. Mas quem está sofrendo pela morte dele é você. Você é o coitadinho...

(Idéias para Lipstick Killer)

Conjunto de vasos que saem do coração e se ramificam sucessivamente distribuindo-se para todo o organismo. Do coração saem o tronco pulmonar (relaciona-se com a pequena circulação, ou seja leva sangue venoso para os pulmões através de sua ramificação, duas artérias pulmonares uma direita e outra esquerda) e a artéria aorta (carrega sangue arterial para todo o organismo através de suas ramificações).


Estrutura:
1- Túnica externa: é composta basicamente por tecido conjuntivo. Nesta túnica encontramos pequenos filetes nervosos e vasculares que são destinados à inervação e a irrigação das artérias. Encontrada nas grandes artérias somente.
2- Túnica média: é a camada intermediária composta por fibras musculares lisas e pequena quantidade de tecido conjuntivo elástico. Encontrada na maioria das artérias do organismo.
3- Túnica íntima: forra internamente e sem interrupções as artérias, inclusive capilares. São constituídas por células endoteliais.

Ramificações:
1- Ramos colaterais: surgem dos troncos principais em ângulo agudo, em ângulo reto ou em ângulo obtuso.
2- Ramos terminais: são os que irrigam com certa exclusividade um determinado território. São os ramos mais ditais.

Relação volumétrica: a soma da área dos lumes dos ramos distais é sempre maior que a área do vaso que lhe deu origem.

Anastomose: significa ligação entre artérias, veias e nervos os quais estabelecem uma comunicação entre si. A ligação entre duas artérias ocorre em ramos arteriais, nunca em troncos principais. Às vezes duas artérias de pequeno calibre se anastomosam para formar um vaso mais calibrosos. Freqüentemente a ligação se faz por longo percurso, por vasos finos, assegurando uma circulação colateral.

Relações:
1- Com as veias: a norma geral é que um artéria seja acompanhada por pelo menos uma veia, sendo chamadas veias satélites. Artérias de grosso calibre geralmente são acompanhadas por uma veia e artérias de média e pequeno calibre são seguidas em seu trajeto por duas veias.
2- Com os músculos: certos músculos servem como ponto de reparo às artérias que os acompanham, sendo chamados de músculos satélites, como por exemplo o músculo esternocleidomastóideo que acompanha a artéria carótida comum.
3- Com as articulações: as artérias sempre passam pela superfície flexora da articulação.


- Desaposentado Ricardo Celestino

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

A VIDA PÚBLICA... SOCIEDADE

Dentre outras formas de se poder viver em sociedade,
Eu sou o que vivo eternamente algemado com meus deveres.

Não me considero enforcado nem subjugado pelo sistema,
Aproveito das primeiras calabresas da pizza parcelada,
Mas ainda sim, sufoca-me um pouco o laço,
A tribuna, os ofícios e os vocábulos.

Dentre outras formas de se poder viver em sociedade,
Eu sou o que vivo eternamente algemado com meus deveres.

Ricardo Celestino

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

À ÚNICA PESSOA QUE CONHEÇO QUE SABE AMAR...

AMOR SINCERO

Te enxergo sem capas, nua
Em um escuro tão determinado a se iluminar
Pouco a pouco iluminando
O que antes a nudez mostrada
Não mostrava em outros cantos.

A surpresa de um embate,
Talvez chamar, combate
O inesperado seja sempre o que se vêm.

Comigo o amor não é um problema
Embora seja sempre passageiro
As ânsias de se gozar no momento é que cicatrizam,
Mas as marcas ficam
E ficam pra ficar.

Vá, lute, escravize-se até algo fazer com que se mude.
O mundo te impede de não ser egoísta,
Mas o egoísmo é um mal necessário,
Não é defeito,
Qualidade,
De um amor sempre atualizado,
E da eterna juventude
Contrastando com as nudezas da mocidade.

Sinto que serei sempre um jovem apaixonado,
Pois Amor envelhecido não me vale,
Independe dos meus sonhos e de minhas buscas,
De toda e qualquer estabilidade.
Amar sim. Completamente.
Fingir, jamais.



RICARDO CELESTINO

NÁUFRAGO DA UTOPIA

``Brecht externou a idéia de que é feliz a nação que não tem necessidad ede heróis. Afinal, a função do herói não vai além de nos apontar caminhos e nos alertar sobre os riscos da existência, o que por si so já os torna imprescindíveis. No mundo real nada substitui a ação humana, por vezes pequena, mas persistente, diária, coletiva, dos seres humanos. Grandes feitos e transformações mágicas cabem muito bem na ficção, pois expressam nossos desejos. Realizá-los cabe aos pequenos feitos cotidianos dos homens na extensão do tempo.``

- Luís Alberto de Abreu - Introdução do livro Náufrago da Utopia.

E se este discurso fosse gritado em todas as escolas do país, talvez muitas cabeças mudariam. Não digo que mudariam assim, do dia pro outro, mas numa grande escala de tempo, se martelássemos essa idéia na cabeça das pessoas. Cultivamos figuras heróicas o tempo todo, e como um bom torcedor apenas observamos como o herói se sai. Normalmente, para não dizer quase sempre, o herói mostra-se um incrível vilão, e aí acontece do direito de voto tornar-se uma grande forma de se manipular as votações, da imagem do presidente nos desmotivar por esperarmos tudo de quem não pretende fazer nada, enfim, de toda a boa imagem que criamos, na prática sendo distorcida por ações malucas.

Em que ponto gostaria de chegar com esse discurso? Bem, lendo o livro de Celso Lungaretti percebo que quanto mais dedicarmos as nossas vidas como bastidores, as mudanças vão correr de nós, vão pra muito longe. No entanto, gritar e expressar é ainda algo muito perigoso. Se antes nossos inimigos eram os militares, hoje lutamos contra a surdez cultivada por eles. E o que mais deve entristecer pessoas como Lungaretti é ver que vozes que gritavam ao teu lado hoje apenas fazem a manutenção de toda essa estrutura podre que nos rodeia desde Cabralzinho.

Bem, meu discurso é torto e mal preparado, mas espero que tenham ao menos a curiosidade de ler o livro dessa interessante pessoa que é Celso Lungaretti. E pra quem mora na Zona Leste, pra ser mais preciso na Mooca, vai curtir bastante as primeiras páginas. Assim como todo moquense, ele também esconde uma vaidade e deve ter uma camiseta do juventus guardada no fundo da gaveta.

- Ricardo Celestino


``Gerson é o primeiro do grupo a sofrer com os novos tempos. Preso por suspeita de subversão, passa um dia apanhando no Deops. Leva choques no pênis, nos testículos. Mas resiste, sabendo que nada têm contra ele; se não confessar, vão acabar acreditando que é um zé-ninguém e o soltarão.``

- Celso Lungaretti.